Peço desculpa sociedade
Acho cada vez mais que nós nunca encerramos tudo, há coisas que ficam
para sempre a moer dentro de nós. Não adianta o quanto grites, chores ou ralhes
com a vida, haverá alturas em que esse mar acalma mas nunca deixa de ser um
oceano de rebeldia. A sensação que temos é a de que ficamos no meio da estrada,
uma estrada que tínhamos desenhado meticulosamente na nossa cabeça. Pena, a
vida não tem mapa…
Nestes anos
que passaram provavelmente a maior parte dos teus amigos “deu um rumo à vida”,
como diria a minha mãe. Muitos estão casados ou a viver juntos com alguém que
namoraram a vida toda, ou não, têm as suas casas com aquela decoração
apropriada de vida adulta, alguns até já têm filhos e são felizes ou outros nem
tanto. A maior parte deles mudou as suas prioridades e agora parece que não
percebes as conversas que eles têm, quando ainda têm algum tempo para as ter.
Nas festas de
Natal ou quando já não vês alguém há muito tempo, a pergunta é sempre a mesma,
as pessoas já quase nem precisam falar porque tu sabes que te vão fazer a
questão: “Mas olha lá quando é que casas?”, “Não está na hora de ter filhos?”.
Mais uma vez falamos de uma sociedade profundamente estereotipada, em que quem
sai fora da regra, torna-se marginal. Uma sociedade profundamente ligada
às tradições que não consegue fazer uma boa gestão da ideia que nem tem toda a
gente pode ou consegue seguir o conceito de namoro, trabalho, casamento, casa,
filhos... Mas com certeza não somos nós que somos uma cambada de anormais e os
outros são os preferidos e perfeitos da sociedade. Isso não funciona assim.
Este estigma é perfeitamente comparável com o preconceito com homossexuais,
porque não haveríamos de ser encaixáveis se na realidade somos todos feitos das
mesmas coisas?
A libertação
do sexo feminino e sua consequente emancipação, leva que as mulheres das
últimas gerações não precisem de ser sustentadas, não precisem de um homem
presente na sua vida. Sem hipocrisias, mas quando tu percebes que a vida vai
andando e tu vives bem com a solidão, quando tens as tuas coisas e na realidade
até gostas de estar sozinha, tu não consegues ceder um milímetro na relação com
outra pessoa. Uma relação sem cedências é uma relação condenada. O pensamento “
porta da rua é serventia da casa” é normal quando tu percebes que não queres
aturar as coisas que a outra pessoa tem e pior que isso não precisas de aturar.
Se isto tem um pouco de egoísmo? Claro que sim, algumas mulheres passaram a não
precisar de nenhum tipo de protecção e isso fez com que se criassem novas
formas para tudo (filhos, prazer, auto-estima) sem que necessariamente tivessem
que ser casadas. Para além disso, tudo isto também leva a que se perca um pouco
de compreensão em todas as coisas, ninguém está para perdoar deslizes, ninguém
admite uma discussão mais acesa porque ninguém precisa de ninguém.
Esta é a
teoria, agora querem uma resposta sincera? As pessoas não são todas iguais. Há
dias maus na vida dos solteiros como há na vida dos casais. Nem sempre é fácil
ser só, gerir a vida inteiramente sozinho e viver sem qualquer amparo. Mas é
uma opção ou outras vezes não é, aconteceu. Pessoas mais inseguras ou carentes
dificilmente se iriam aguentar a viver sem apoio, sem afectividade, sem sexo
também (se bem que isso hoje em dia é uma questão meramente opcional). Mas
embora seja perceptível ou não, comum ou não, existem pessoas que conseguem e
gostam de viver assim, existem pessoas que não querem ser pais ou ter uma
família pelo menos aos vinte e tantos.
Por último
querem a minha resposta? O formato casal é a forma mais confortável de existir,
é assim que a história nos ensina a ser, é assim que a moda dita e é também
assim que qualquer pessoa se imagina, antes de crescer. Crescer e perceber que
isto não é igual para todos. Peço desculpa sociedade, se não tive oportunidade
de me encaixar em ninguém. Nem tem todos temos essa sorte ou em alguns casos
esse azar. Vivi o tempo suficiente para entender que o mais comum não são
relações com base no respeito e no amor, o mais comum nos nossos dias são
relações baseadas na aparência, falsa estabilidade e no “eu sei que ele é mau,
mas é melhor do que estar sozinha”.
Peço desculpa sociedade
por fazer parte desse grupo de ovelhas negras, pessoas estranhas que ninguém
percebe e que devem ser ruins de aturar porque ninguém as quer. Peço desculpa
sociedade por ainda não ter alterado o meu estado civil, peço desculpa por
defender algo que a maioria se esqueceu o que é. Peço desculpa sociedade. Estou
e continuarei assim justamente porque acredito no amor e não tenho vergonha
nenhuma de o escrever.
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